Tenho um gato debaixo da cama. Faz-me espirrar. É obeso, chama-se Leão e parece um cão. Aqui praticamente jazida no frio clandestino de Coimbra lembro-me de uma corda. Uma corda ao mar. O gato mexe-se debaixo da cama. A corda serve perfeitamente para o enforcar. Mas não cura a alergia.
Deixo-o ficar.
Pego na corda.
Enfio-a pelo motor de busca e vou de encontro ao meu Verão. Uma corda, um esboço de troço rasgado na penumbra do rochedo. O embate agressivo do mar chama por mim. É ali que me apetece afogar, penso em primeira mão. Este mau mar, que tão mau que é, mata-me sem dó nem piedade. Precisamente o que preciso. Naquele dia, naquele momento.
Escarpo com a ajuda da mãe natureza a minha figura milimétrica pela corda abaixo. É só não cair. O mar está já ali. De ondas assombrosas, espumosas, evidentes da minha presença. Esperam entre sets. Assim que a fina areia se entranha na pele queimada dos meus pés, lanço-me. Suga-me o veneno. Sobe por mim um rastilho congelado de emoções. Revejo a vida ao segundo. Leva-me, pouco a pouco, entre a lividez dos pensamentos, a corda que sufoca.
Liberto-me. Em cada onda, a raiva franca transforma-se naquele sal de um mar com brio. Flui. Ali pertence. Vejo-me. Hoje à distância pelo mapa do motor de busca, e uma corda ao mar. Na eterna sensação de querer enforcar o mergulho num dia quente de Verão. Para já, vou apenas flutuar.